O Gigante Esquecido





John Fletcher (1729-1785): O Gigante Esquecido

Quando pensamos nos primórdios do Metodismo, os nomes de John e Charles Wesley vêm imediatamente à mente. No entanto, há um terceiro pilar crucial, um teólogo e santo que, embora menos conhecido hoje, foi considerado por John Wesley como seu sucessor natural e um homem sem igual: John William Fletcher.

Nascido Jean Guillaume de la Fléchère em Nyon, Suíça, em 12 de setembro de 1729, Fletcher veio de uma família aristocrática huguenote. Sua jornada para o ministério não foi direta. Educado na Universidade de Genebra, ele inicialmente sonhava com uma carreira militar. Uma série de reviravoltas providenciais – incluindo um acidente bizarro em Lisboa que o impediu de embarcar para o Brasil em um navio que mais tarde desapareceria no mar – o guiou para a Inglaterra em 1750.

A Conversão e o Chamado para Madeley

Em Londres, enquanto trabalhava como tutor para uma família rica, Fletcher encontrou os metodistas. Sua conversão em janeiro de 1755 foi um processo profundo de luta interna e revelação. Ele, que antes praticava uma religião legalista, descobriu a justificação pela fé. A anedota de ter sido tocado por uma "velha mulher que falava docemente de Jesus Cristo" e de sua busca incansável pelos "metodistas que só oravam" ilustra seu fervor.

Em 1757, Fletcher foi ordenado sacerdote na Igreja da Inglaterra. Ele recusou um posto lucrativo para aceitar a humilde paróquia de Madeley, em Shropshire, uma cidade industrial repleta de mineiros e com grande necessidade espiritual. Por 25 anos, ele se dedicou de forma incansável aos seus paroquianos. Madeley, antes conhecida por sua "ignorância e profanidade", foi transformada por seu zelo: bares fecharam e a vida moral da comunidade melhorou. Ele pregava não apenas na igreja, mas nas casas, nos campos e nas minas de carvão, buscando os pecadores onde eles estavam. Seu método pastoral, descrito por sua esposa Mary, envolvia pregação frequente e a formação de pequenas reuniões com "Líderes" para acompanhamento espiritual.

O Teólogo da Santidade e da Unidade

John Fletcher foi o principal sistematizador da teologia metodista, defendendo as doutrinas arminianas de expiação ilimitada e livre-arbítrio contra o calvinismo rígido de sua época. Sua obra mais famosa, "Checks to Antinomianism" (Verificações sobre o Antinomianismo), foi uma resposta vigorosa às críticas ao Metodismo, defendendo a necessidade moral das boas obras que acompanham a fé. Fletcher acreditava que não se podia separar a fé dos frutos de uma vida cristã, e seus escritos ajudaram a estabelecer a doutrina metodista da Perfeição Cristã, ou inteira santificação.

Sua abordagem teológica era a da "via media" (caminho do meio), buscando a "oposição harmoniosa das Escrituras" para conciliar verdades aparentemente contraditórias. Sua profundidade teológica era tal que John Wesley ordenou que todos os seus pregadores lessem as obras de Fletcher.

Homem de Oração e Caráter Excepcional

A vida de oração de Fletcher era lendária. Para ele, a oração era um "refrigério e inspiração", o "grande meio instrumental pelo qual a alma é mantida viva". Ele dedicava de 14 a 16 horas diárias ao estudo das Escrituras e passava noites inteiras em oração, frequentemente em seu estudo, onde a parede perto de seu local de oração apresentava "manchas profundas do hálito que ele gastava em súplicas fervorosas."

Sua disciplina espiritual o ajudou a vencer uma forte propensão à raiva, tornando-o um homem de extraordinária mansidão e humildade. Ele buscava manter um "sentido ininterrupto da presença divina" e seu objetivo era sempre elevar seu próprio espírito e o de outros a uma "interação imediata com Deus".

Em 1781, aos 52 anos, casou-se com Mary Bosanquet, uma das primeiras mulheres pregadoras autorizadas por Wesley. O casamento, embora feliz, durou menos de quatro anos. Mary foi uma parceira dedicada, apoiando seu ministério e orando com ele.

Morte Prematura e Legado Imortal

John Wesley havia escolhido Fletcher como seu sucessor, mas Fletcher faleceu primeiro, em 14 de agosto de 1785, aos 56 anos, de tifoide, durante uma epidemia em Madeley. Sua morte foi, em parte, resultado de seus "trabalhos sem precedentes" e de sua dedicação incansável, que o levou a pregar mesmo nos seus últimos dias.

John Wesley, um homem de avaliações sóbrias, prestou a Fletcher um dos mais altos tributos de sua vida: 

"Muitos homens exemplares eu conheci, santos no coração e na vida, em oitenta anos, mas um igual a ele eu não conheci — um tão interiormente e exteriormente devotado a Deus. Um caráter tão irrepreensível em todos os aspectos eu não encontrei na Europa ou na América; e eu mal espero encontrar outro assim deste lado da eternidade."

Henry Venn, outro líder do avivamento, o chamou de "um sol" e afirmou que "nunca ouviu [Fletcher] dizer uma única palavra que não fosse própria".

Embora sua vida tenha sido curta, John Fletcher deixou uma marca indelével. Ele personifica a busca incansável por uma fé viva e transformadora, ancorada na graça divina e expressa em obras de amor e justiça. Seu legado como teólogo, pastor e homem de santidade continua a inspirar, provando que, mesmo "esquecido" por alguns, seu impacto reverbera através dos séculos.

(Versão completa aqui)


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